Deixo-vos o Carnaval dos Animais em versos. Divirtam-se!
Boas férias.
Saint-Saens – Carnaval dos Animais
Versos de João Belchior Viegas
Grande fantasia zoológica,
chamou Saint-Saens a esta obra,
que exclui com certa lógica,
entre vários animais, a cobra.
Que outro compositor celebre
os que ficaram de fora
como por exemplo, a lebre.
Os eleitos iremos vê-los agora.
Um leão extremamente místico e voraz
mastiga ossadas franzindo o sanho.
O leão, como sabem, é um quadrúpede capaz
de atingir em alguns casos um grande tamanho.
Vive na selva, paraíso denso, que atroa
com rugidos medonhos e corridas loucas.
Quando se apaixona, casa com a leoa,
fêmea graciosa e terna como há poucas
O galo é um animal bulhento
que grita como um sargento.
Da sua fêmea, a galinha,
faz-se excelente canjinha.
O onagro, ou burro selvagem,
que é por excelência um azinino
não tem vocação para a viagem
e caracteriza-se pela falta de tino
Na idade própria zurra
para atrair a burra ou onagra.
A onagra é bastante burra
e distingue-se por ser mais magra.
Há quem teime que a tartaruga
é um bicho sem predisposição
para a dança, o salto e a fuga.
Tudo é uma questão de opinião
mas o que ninguém pode desmentir
é que a tartaruga não tem dentes
o que a impede de sorrir
e que da carapaça se fazem os pentes.
O elefante erradamente chamado paquiderme
é um gigante com epiderme coriácea;
tem dentes de marfim, alimentação herbácea
e anda assim… assim…
Ah! A força é de arromba
e bebe água pela tromba.
Dos marsupiais o canguru
é a espécie mais falada
por ter fama de liru
e nunca estar sossegada.
Por acaso sabes que o canguru
embora leve vida de cigano
é na realidade australiano?
E que para não ficar estafado
de tão frenética sarabanda
passou a andar sentado.
E quando está sentado, anda.
Há cachuchos e há baleias,
há moreias e há sereias;
uns são vorazes, outros gorazes.
A tainha tem muita espinha
e o peixe-espada não usa bainha;
se a pescada é pescada,
o cação é caçado
pois ninguém sobrenada
no grande mar salgado.
Do reino das mulas
as notícias são nulas.
No mundo da passarada, os cucos
passam por perfeitos malucos
mas a verdade sem mais demoras
é que só eles sabem dar as horas.
Na madre natureza, os passarinhos
são belos ornamentos musicais.
Ouvindo a flauta dos pastorinhos
compõem melodias celestiais.
O roussinol canta Rossini
e o papagaio Papaganini;
a codorniz dança o Xote
e a gaivota a Gavotte.
Moralidade: para ser artista
há que comer muita alpista.
Neste Carnaval dos animais
passa-se agora em revista
um com dotes excepcionais.
Trata-se, claro está, do pianista.
Não confundam porem estes bípedes
com os animais chamados solípedes
pois só é pianista original
aquele que for às no pedal.
Da infinita variedade de animais
há uns que se destacam entre os mais
pela sua estranha configuração
que nos desperta logo a atenção.
Não admira pois que certo tolo
censurasse bestas menos dóceis
gritando“que fossem fazer tijolo”
e acrescentando “oxalá fosseis fósseis”.
O cisne é um animal absorto
que se parece bastante com o pato.
Dizem que só canta quando está quase morto
o que é afinal uma questão de tacto.
E eis o grande final
do Carnaval animal.
Farândola de criaturas obtusas
toda em colcheias e semifusas.
Foi alegre o Entrudo
com pianistas e tudo
e, se gostou do entremês,
toque o disco outra vez.